Sumário

Qual o futuro do nome da sua empresa?

Saiba como as Redes Sociais entendem o nome de um estabelecimento comercial e o que você pode fazer se alguém copiar seu nome empresarial

Retrospecto

O nome empresarial é o conjunto de signos escritos que individualizam uma empresa. Embora exista previsão legal em nosso Código Civil, muito mais utilizados são os institutos do Direito Marcário para tratar desse tema. Como desdobramento e atualização para o, à época novo, mundo digital do nome empresarial, é que surgem os nomes de domínio.

Com o surgimento da Internet na década de 1960 e, especialmente, com a criação da World Wide Web (o conhecido “www”) em 1989, buscou-se facilitar o encontro entre empresa e consumidores online; de tal sorte que foi criado, muito por influência do Sistema de Nomes de Domínio (SND), um padrão de busca: hostname + second-level domain + general top-level domain, respectivamente, por exemplo, www + apple + .com. Esse endereço eletrônico é, na verdade, o nome de domínio: signo distintivo que identifica uma empresa no meio digital; é a referência e local virtual onde a clientela pode encontrar a entidade societária que procura. Não se trata de estabelecimento virtual, mas de adaptação do nome empresarial para o mundo das redes.

Como se sabe, os nomes de domínio estão sob responsabilidade da OMPI (Organização Mundial da Propriedade Intelectual), mais especificamente, da ICANN (Internet Corporation for Assigned Names and Numbers), a qual, por sua vez, é a única organização a deter a governança da Internet, ou ainda “ICANN’s mission is to help ensure a stable, secure, and unified global Internet.”

O braço da ICANN sobre o assunto de nomes de domínio é, por sua vez, a Uniform Domain-Name Dispute Resolution Policy (UDRP), entidade criada para resolver questões mais abrangentes, tanto assim o é que suas decisões possuem força relevante apenas nas situações onde o gTLD (General Top-Level Domain) é “.com” ou “.net”, as exceções aqui são os países que, voluntariamente, quiseram possuir vinculação à UDRP.

Quando voltamos nossos olhos ao Brasil, possuímos algumas entidades que dissertam sobre os nomes de domínio, como INPI, ABPI, CSD-PI, CGI.br, Registros.br e SACI-Adm. O Sistema Administrativo de Conflitos de Internet Relativos a Nomes de Domínio (SACI-Adm), em particular, é uma ramificação da UDRP, com regras e critérios similares. Em poucas palavras, trata-se, aquele, de órgão administrativo – anexo ao Registros.br –, cuja função é solucionar conflitos no que tange aos nomes de domínio na World Wide Web.

Apesar da relativa organização de entidades que tutelam direitos sobre nomes de domínio, há clara defasagem destas perante às Redes Sociais, principalmente quando se analisa de perto os nomes de usuários (usernames). Estes, por sua vez, são o transplante de uma versão simplificada dos nomes de domínio.

Se, na seara ampla da Internet, ter-se-ia o nome de domínio www.apple.com; basta, no Instagram, procurar o nome de usuário “Apple” para encontrar a empresa desejada. Fato é que as Redes Sociais estão inseridas no domínio da Internet, de tal sorte que se quisermos encontrar essa mesma empresa diretamente de um navegador, devemos procurar por “www.instagram.com/apple/.” Ou seja, o nome de usuário não está diretamente inserido na Internet mas, na verdade, está resguardado pela barreira da Rede Social. Cabe saber quão rígido é tal obstáculo para então entender como as Redes lidam com a tutela de direitos, especialmente aqueles que dizem respeito aos nomes de usuários. Esse cenário gera insegurança jurídica, que será detalhada a seguir.

O “decidir” das redes

Como mencionado, a UDRP é a principal instituição internacional na solução de litígios sobre nomes de domínio. Assim, a UDRP possui força vinculante apenas na seara da Internet (gTLD), não estendendo suas decisões às Plataformas. Situação idêntica acontece para o SACI-Adm, pois este decide apenas perante o domínio “.br” e não sobre o Second-Level-Domain (e.g. X, Instagram, TikTok, etc.).

Diante desta situação, cabe entender a quem se deve recorrer em caso de cybersquatting e typosquatting, ambos são situações de má-fé nas quais terceiros que se valem de usernames registrados por legítimo titular – ou ainda, que àqueles apenas não possuem interesse de boa-fé tampouco legitimidade para usar de tal signo distintivo (contas que se fazem passar por outra pessoa senão a legítima) –, se as “tradicionais” entidades encontram-se diante de uma barreira impermeável: a jurisdição das Redes.

Com efeito, há pouco a ser realizado. Ao descobrir um nome de usuário que de alguma forma usurpe de um direito de signo distintivo, o Reclamante (suposto titular) pode denunciar, pela própria Rede, tal nome de usuário usurpador; após, a sorte estará lançada. O resultado da reclamação pode ser favorável, ou não, ao Reclamante; mas, para além disso, não há maiores informações. O que se sabe é que a denúncia será analisada por um colaborador (equipes de análise) da Rede Social (ou, eventualmente, mero algoritmo) e, quase que como uma Arbitragem, ter-se-á um veredito em nome da Rede, este, por sua vez, terá poder coercitivo nesta seção digital e assim, quase que como uma sentença de um juiz natural e, logo, estatal, deverá ser executado.

Talvez, neste ponto habite o principal problema das tomadas de decisões sobre remoção ou manutenção de um username pela social media: a falta de transparência e precisão.

Nesse sentido, o processo de alteração ou manutenção de titularidade de um elemento distintivo, o que, no macromundo Internet, possui fundamentada e devidamente explicada decisão do órgão competente (UDRP ou SACI-Adm em terras brasileiras); nas Redes, tem-se o contrário, um “tiro no escuro”, pois tanto não é clara a existência de um procedimento que garanta o contraditório efetivo e devido espaço às provas do Reclamado, como inexistente é a exteriorização ou materialização da maneira, isto é, o raciocínio pelo qual o “árbitro da Rede” optou por tomar uma decisão (im)procedente ao pedido. Há, logo, clara ameaça à segurança jurídica.

Há imprevisibilidade justamente por não haver um padrão visível de decisão. Não se sabe as regras do jogo que resultaram no placar final. Na verdade, as regras são as mais vagas e pouco revelam sobre a decisão; trata-se dos “Termos de Uso/Serviço” ou “Diretrizes da Comunidade”, estes, por sua vez, servem de norteadores dos deveres e direitos que possuem tanto o usuário, como a Rede.

A “infração às Diretrizes da Comunidade” é a premissa mais corriqueira para explicar a alteração/manutenção na titularidade de um signo distintivo tal qual o username; dessa forma, reduzem-se custos de transação da Plataforma, pois tais Diretrizes tipificam inúmeras condutas, diminuindo as possíveis variáveis no texto decisório; um inteligente e eficiente movimento por parte das Redes, mas pouco satisfatório às Partes conflitantes.

Políticas fragmentadas das Redes

Delimitada a rigidez que impõem as Redes aos procedimentos de solução tradicionais, cabe, por fim, dissertar sobre as peculiaridades que cada Plataforma possui quanto aos nomes de domínio.

As particularidades em questão são outro ponto motivo de crítica à tal solução de conflitos; se cada Plataforma possui uma Diretriz específica, haverá critérios específicos de decisão para cada Rede, consequentemente, tem-se insegurança jurídica, pois uma métrica pode ser decisiva para uma Rede, e insignificante para outra.

Instagram

O Instagram possui, em média, o surpreendente número de 1,47 bilhões de usuários ativos mensalmente. Razoável pensar que, nesse enorme universo, as interseções de nomes empresariais sejam corriqueiras e que, eventualmente, haja cybersquatting.

Para mitigar os danos de confusão, a plataforma conta com mecanismos como:
i) Central de Transparência, onde se pode conferir algumas políticas de monitoramento e relatórios de transparência; e
ii) Combate, em tese, proativo, pois:
“NOSSA TECNOLOGIA ENCONTRA MAIS DE 90% DO CONTEÚDO PARA O QUAL TOMAMOS MEDIDAS ANTES QUE ALGUÉM O DENUNCIE.”

X

O antigo Twitter, hoje apenas X, possui 550 milhões de usuários. Vejamos algumas de suas políticas contra o cybersquatting. O X se vale de medidas de mera conferência, como “Desafios anti-spam”, como também de medidas com certo teor de coercibilidade, tal qual a suspensão da conta. Há possibilidade de recorrer a uma medida da plataforma no que tange a este aspecto.

Conclusão

Os nomes empresariais, vocativos das empresas, evoluíram de tal forma a gerar os nomes de domínio – endereço eletrônico na WWW –, estes, por sua vez, foram simplificados e translocados para as redes sociais, de modo a se ter o username.

Se o instituto evoluiu, é normal pensar que assim também o façam as entidades que o tutelam. De fato, surgiram órgãos como a UDRP e o SACI-Adm; houve, nesse sentido, um avanço, pois deu-se a uma matéria específica (nomes de domínio) um meio de solução igualmente específico, resultando, logo, em maior precisão à sentença de tal entidade.

Porém, a solução para disputas sobre usernames ainda é falha, porque depende de um julgamento interno das próprias plataformas, sem transparência e clareza. Isso deixa as partes envolvidas em um processo imprevisível, sem saber como as decisões foram tomadas. Além disso, curiosamente, o poder de decidir sobre um direito de propriedade intelectual é dado a uma entidade privada, sem vínculo com o Estado, o que significa que essas plataformas têm liberdade para estabelecer suas próprias políticas e critérios decisórios, que ainda estão em falta.

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